E POR FALAR EM DANÇA... SE LIGA NO PASSINHO!!!

Documentários sobre o ‘passinho’ mostram a origem e a nova fase do estilo de dança

Mariana Filgueiras (Email)
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A dançarina Lellêzinha é uma das poucas meninas que se destacam na cena do ‘passinho’ Fábio Seixo / Agência O Globo
RIO - Numa das cenas mais emocionantes do filme “A batalha do passinho” — que estreia nesta sexta-feira nos cinemas do Rio e conta a história do estilo de dança que renovou o funk carioca —, o jovem Cebolinha, de Cascadura, tido como um dos primeiros grandes dançarinos do gênero, duela com outro “rei” do estilo, Gambá, da Ilha do Governador, morto tragicamente em janeiro do ano passado. Enquanto Cebolinha “rabisca” na quadra, Gambá o provoca, faz cena, arriscando alguns passos que anunciam o desafio. O que se sucede é quase a cena final de “Flashdance” na quadra do Sesc Tijuca: os dois, juntos, e de maneira completamente espontânea, fazem com que suas coreografias se complementem. Os movimentos de pés, joelhos, quadris e cintura são hipnotizantes. A plateia — cerca de 200 crianças e jovens que acompanhavam a batalha — vai ao delírio.

— Minha ideia inicial era fazer um curta registrando as quatro etapas da primeira Batalha do Passinho, entre setembro e outubro de 2011. Mas quando vi aquele monte de criança dançando, com toda aquela marra, aquele estilo, aquela malandragem já adquirida das ruas, eu pensei: “É esse o funk que as pessoas morrem de medo? É esse o funk que dizem que desvirtua a sociedade? Não, não é” — analisa Emílio Domingos, antropólogo e cineasta. — Eram crianças de 4 anos de idade dançando sem professor. Além disso, tinha esse fator da amizade, que é muito emocionante. Por causa da dança, eles se unem, se ajudam. Era assunto demais para não virar um longa.
Filmado dois anos depois, o documentário “Da cabeça aos pés” — que vai ao ar hoje na programação da Globonews e é apresentado por dois dançarinos, Leandra Perfect’s e Rafael Nike — registra um segundo momento do passinho: numa das batalhas já patrocinadas por uma marca de refrigerantes, os meninos (e algumas poucas meninas, como Lellêzinha) se exibem para uma plateia de milhares de pessoas. Já são estrelas. Já ganham algum dinheiro fazendo apresentações. Já assinam contratos de exclusividade. Já dão aulas particulares da dança. Já são encorajados pela família. Já medem a popularidade não só pelo número de “views” de seus vídeos no YouTube, mas pelo número de fãs que fizeram tatuagens com seus nomes.

— A ideia era aproveitar o sucesso desse fenômeno e fazer um programa aqui na Globonews. Mas quando começamos a acompanhar alguns personagens, conhecer suas histórias, decidimos que valia um documentário — explica a diretora do programa, Renée Castelo Branco.
Apesar de já existir como estética nas comunidades desde 2004, surgido nos bailes funks e nas ruas das comunidades por dançarinos que disputavam “quem era mais pika”, foi nos últimos dois anos que o passinho cresceu e se espalhou pela cidade.
Com os patrocínios de empresas, as batalhas ficaram frequentes, e mais jovens se destacaram. Chamaram a atenção de programas de TV, e alguns foram contratados como atração. Participaram da cerimônia de abertura dos Jogos Paraolímpicos, em Londres, e da programação paralela do Rock in Rio. Na quinta-feira, foram uma das atrações do festival de performances audiovisuais Multiplicidade, no Oi Futuro do Flamengo.

— É uma dança com um senso libertário imenso, porque o passinho absorve tudo ao seu redor. Essas muitas linguagens artísticas recombinadas fazem parte do DNA do festival — elogia Batman Zavarese, curador do evento.

Na primeira Batalha do Passinho, a mesma que o cineasta Emílio Domingos filmou, em 2011, um dos jurados do concurso era o roteirista e diretor da TV Globo Rafael Dragaud, um dos idealizadores do programa "Conexões urbanas", do Multishow, com o Afroreggae, cuja trajetória profissional sempre esteve ligada aos movimentos culturais de periferia. Encantado com o que viu, foi Dragaud quem mostrou o passinho às grandes empresas, o que acabou dando mais visibilidade e estrutura aos dançarinos. Ele acredita que o passinho é apenas "a ponta de um imenso iceberg":

— O público em geral ainda está num momento de entender o que é passinho, o que ele representa como fenômeno cultural. A cultura pop tem uma velocidade própria para ser compreendida, para chegar até as pessoas. O passinho já está lá na frente, já atingiu sua maioridade estética. É a ponta de todo um processo de recuperação da autoestima dos jovens de comunidades carentes, que reflete uma nova maneira de existir, de comportamento. Não é só uma modinha coreográfica. Eles estão protagonizando suas próprias histórias pela primeira vez.

Nesta onda, Dragaud selecionou os dançarinos que considerava mais criativos e dirigiu o vídeo viral "Aperte o play". O clipe foi lançado no último dia 20 na internet para divulgar o Baile do Passinho, evento que vai acontecer durante quatro domingos nas comunidades de Santa Marta, Macacos, Alemão e Rocinha, com entrada gratuita. O clipe do grupo, chamado de dream team, é uma amostra clara desta nova fase do passinho: com produção impecável, foi filmado em diversas locações, teve coreógrafo e direção de arte. Na primeira semana, foi visto 700 mil vezes.

— Minha intenção é aproximar este movimento do grande público, pois ainda há muita arrogância quando se fala em cultura das favelas — resume Dragaud.

Um dos destaques do dream team é a estudante Lellêzinha, apelido de Alessandra Aires, de 15 anos. Aliás, esta é outra mudança na cultura do passinho: cada vez mais meninas aparecem com destaque nas batalhas, que não fazem distinção de gênero na hora de “embrasar”. Mas elas continuam minoria.
Lellêzinha, que é também uma das personagens do documentário “Da cabeça aos pés”, ficou em terceiro lugar na segunda Batalha do Passinho, no Morro da Formiga. Estudante do primeiro ano do ensino médio, não faz nada sem total aprovação da mãe.

— Meu sonho é me tornar uma dançarina profissional. Só consegui entrar numa escola de dança depois das batalhas de passinho — comenta a menina, fã de Beyoncé e dona de um farto cabelo crespo com luzes (que diz não alisar de jeito nenhum).

A vontade de se profissionalizar é comum à maioria dos dançarinos, concordam os diretores Dragaud, Renée Castelo Branco e Emílio Domingos. Tanto que eles mesmos estão começando a criar soluções para a falta de oportunidades: aprendem tudo no YouTube e criam escolas de passinho dentro das próprias comunidades. Já tem curso de passinho na Cidade Alta, no Cantagalo, no Borel, além das aulas particularidade que muitos dançarinos dão nas lajes dos amigos. No Borel, por exemplo, a iniciativa se chama Escola Livre do Passinho e conta, inclusive, com um videomaker e professor também para os clipes personalizados com os quais os dançarinos buscam popularidade na internet.
— Aqui eu filmo, edito e publico os clipes dos dançarinos, e também ensino — explica Carlos Eduardo Lucio Ribeiro, de 22 anos, que trabalha como fotógrafo freelancer e “que não dança nada”, como repete.

Junto a dois outros amigos, Carlos Eduardo teve a ideia de criar a escola no início do ano, ao perceber a demanda no Borel. Participante do programa social Agência de Redes para a Juventude, que capacita e seleciona projetos idealizados por jovens de comunidades, a Escola Livre do Passinho foi uma das iniciativas aprovadas e ganhou patrocínio público de R$ 10 mil para começar a funcionar em junho.

Na terça-feira passada, aconteceu a primeira aula que Cebolinha, um dos personagens principais do filme “A batalha do passinho”, deu no Sesc de Realengo, no Curso do Passinho gratuito que a entidade passou a oferecer no bairro.

— Botei eles pra suar! — anima-se ele, Jefferson Chaves na certidão, que tem 23 anos e sustenta a família com o dinheiro que ganha com a dança. — Eram oito alunos, mas, quando acabou a aula, outros cinco já tinham se matriculado também.

“Velha guarda” do passinho, Cebolinha observa tantas novidades no fenômenos do qual foi um dos precursores com um pé atrás: ele teme que o estilo esteja perdendo a espontaneidade.
— Acho que tem muita gente já querendo dançar passinho para ganhar dinheiro, e se esquece de inovar, de usar a criatividade nos passos. Não participa das comunidades (debater as performances nas redes sociais é uma das características agregadoras do movimento). Tenho medo que o passinho, como era, comece a cair muito — comenta Cebolinha, pouco antes de mostrar um vídeo em que aparece correndo das fãs num shopping de Angra dos Reis.
E POR FALAR EM DANÇA... SE LIGA NO PASSINHO!!! Revisado por LíderesOrtaéticos em 09:33 Classificação: 5

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